terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Olhando nuvens vagabundas

Depois do Pequeno Príncipe, os primeiros livros que li foram Cadeira de balanço, de Carlos Drummond de Andrade e Ai de ti, Copacabana, de Rubem Braga que se tornaram responsáveis pela instituição da crônica como gênero em nossa formação literária e assim permanecem. Drummond, no entanto deu passos adiante em seu versejar universal até ser considerado um dos nossos maiores poetas desde Gregório de Mattos. 

Mais de 30 anos depois voltei a ler “Ai de ti, Copacabana”, de Rubem Braga, através de um exemplar retirado na biblioteca do Morro do Chapéu. O prazer da leitura despertado pelas crônicas do segundo filho mais importante de Cachoeiro de Itapemirim - ES, o primeiro é o Rei, continua o mesmo, onde a simplicidade de fatos do cotidiano são transformados em belas lições de humanismo e valorização da vida. As crônicas que era e são pequenos relatos de acontecimentos diários abrigados nas páginas dos jornais, ganharam status literário através da singeleza e momentos de rara poesia pelo cronista Rubem Braga.

O documentário Rubem Braga – olho nuvens vagabundas, visto recentemente no Canal Brasil traz depoimentos de amigos e pessoas que conviveram com ele em relatos curiosos e bem-humorados que revelam a sua docilidade de espírito, uma ingenuidade quase infantil aprisionada em um sujeito carrancudo, cara de poucos amigos e movido a doses e doses de uísque. Do alto de sua cobertura em Copacabana cuja vista para o mar foi se perdendo à medida que a especulação imobiliária ia erguendo suas palafitas chiques, como uma muralha frente ao Atlântico, o velho Braga praguejou contra a outrora “Princesinha do mar”:

 “Ai de ti, Copacabana, porque a ti chamaram Princesa do Mar, e cingiram tua fronte com uma coroa de mentiras; e deste risadas ébrias e vãs no seio do noite”.
“E os escuros peixes nadarão nas tuas ruas e a vasa fétida das marés cobrirá tua face; e o setentrião lançará as ondas sobre ti num referver de espumas qual um bando de carneiros em pânico, até morder a aba de teus morros; e todas as muralhas ruirão”
Ai de ti, Copacabana, porque os badejos e as garoupas estarão nos poços de teus elevadores, e os meninos do morro, quando for chegado o tempo das tainhas, jogarão tarrafas do Canal do Cantagalo; ou lançarão suas linhas dos altos do Babilônia”.

Foto: Copacabana

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