quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

A primeira Copa que ouvi.


O rádio era os nossos olhos e ouvidos do mundo, já que televisão era algo muito distante por aqui onde nos encontrávamos de calça curta, bola de pano e chinelo de couro. Embora o Brasil já vivesse às voltas com o novo invento da televisão, as imagens da Copa do Mundo de 1958, na Suécia nos chegaram muito depois, em filmes e vídeo tapes com imagens desfocadas e em preto e branco, mas suficiente para imortalizar a primeira conquista como campeão mundial de futebol.

Como já havia registrado no primeiro exemplar da serie Histórias de Piritiba, a Copa do Mundo na Suécia nos chegou através do serviço de”alto falante” da bomba de gasolina de Seo Miro, em frente onde hoje resiste o abrigo, na Praça do Comércio da cidade alegre, que um dia foi símbolo da modernidade em serviço de bar e de lazer.

A tecnologia que fazia ecoar por toda a área a voz dos locutores esportivos, diretamente dos estádios suecos através de suas emissoras de rádio, era amplificada ao volume possível da criatividade do proprietário da bomba de gasolina de Seo Miro e a sua casa de peças, graxas e óleos, O Parafuso. Alí, uma plateia cativa se sentava em volta da torre onde se encontrava o “alto falante”, como se estivesse em torno de um campo de futebol. As ondas do rádio iam e vinham como o mar, em momentos que não deviam ir, pois, em ocasiões assim, Garrincha avançava, driblava, deixando dois marcadores no chão, enquanto nós esfregávamos as mãos, coçávamos a cabeça sem saber qual o desfecho que Garrincha havia dado ao lance e onde a bola teria ido parar. 

Claro que no gol, como saberíamos segundos depois, talvez um minuto, quando o locutor informava o placar que nos beneficiava mais uma vez. A final seria contra os donos da casa e por serem os anfitriões, em que pese a nossa campanha, não poderia haver menosprezo nem comemoração antecipada, mesmo que tudo fosse, como era, favorável a nossa seleção, mas sem descuido.

Com descuido ou não a Suécia abriu o placar, 1 x 0 e, o espanto se espalhou pela praça em volta do “alto falante”,  interrompendo por alguns instantes a passeata programada com o Brasil Campeão. Mas eis que Vavá busca o empate e logo depois nos põe à frente do placar, recuperando a autoestima momentaneamente ferida e reorganizando a festa que parecia comprometida, para no final arrastar as chinelas, levantar a poeira pelas ruas de barro da nossa cidade. Salve a seleção que encantou os nossos ouvidos de menino, para sempre.

Foto: Brasil Campeão - 1958

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