quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Palhaço!

É admirável esta interatividade, esta relação, não de extremo respeito ou reverência que as novas vozes da nossa música parecem estabelecer com vários expoentes do nosso samba mais tradicional, via Noel, Cartola, Nelson Cavaquinho, por exemplo. É a busca da qualidade da poesia urbana, da favela, do morro nestes e em outros criadores dos primórdios do samba que fincaram os pilares da música que poderia surgir a partir dali e, que seduz e desperta a curiosidade dessas novas vozes musicais, a que foram sendo acrescentados elementos da época em que foram redescobertos ou pinçados, sem desvirtuar a sua melodia, mantendo a integridade da canção. Já comentei aqui, o que Arnaldo Antunes e o guitarrista Edgard Scandurra haviam feito com o samba-canção de Lupicínio Rodrigues, a bela e estranha Judiaria, ainda que naquela época tenha chamado minha  atenção a letra machista do compositor gaúcho, bem mais que o solo estridente e rascante da guitarra do Edgard.

Para um samba de Nelson Cavaquinho inicialmente gravado por Dalva de Oliveira e que novas gravações foram surgindo nas vozes de Elizete Cardoso, Beth Carvalho ou Clara Nunes, dá a impressão que Palhaço já tinha se exaurido em termos interpretativos após os registros por estas grandes cantoras. Mas não, Nelson Cavaquinho continua sendo um poço cuja água nunca seca e que sambas como Folhas Seca, Juízo Final, A flor e o espinho, Luz Negra, Minha Festa e outras mais, não esgotaram a sua capacidade de nos surpreender, basta que para tanto esteja a frente da iniciativa, jovens talentosas como Céu, esta revelação da música paulista.

Em seu mais novo e terceiro disco, Caravana sereia bloom, a cantora Céu inicia os trabalhos com Palhaço de Nelson Cavaquinho e segue com composições próprias ou de jovens compositores com quem ela se identifica. E Nelson, para os desavisados, pode parecer um deles, já que a gravação de Palhaço começa a rodar com aplausos vindos de alguma plateia, ou de algum picadeiro, seguidos por um assovio de quem tem a voz arranhada por anos de cigarro e cachaça, como a de Cavaquinho, sons de bares, copos, moedas, violão grave que pontuam a canção em sua poesia, alem de modernizá-la, como se fosse necessário. “Sei que choras palhaço, por alguém que não te ama”. Há na nova música brasileira, algo além de Marisa Monte. É prazeroso descobrir.

Foto: Céu

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