sexta-feira, 2 de março de 2012

Carlos Sampaio - 70 anos depois.

Carlos Sampaio, se vivo fosse, completaria este ano de 2012, exatamente 70 anos. Casualmente abri o arquivo com o projeto de uma monografia sobre Carlos, que nunca consegui concluir. Esta tarefa me levou, prazerosamente, a contatos com figuras inesquecíveis do mundo cultural e boêmio de Salvador. Pessoas como Prof. Guido Araujo, a atriz Nilda Spencer, o escritor Ildásio Tavares, o cineasta Otávio Bezerra, o diretor de produção Chico Drummond e figuras populares como Clarindo da Cantina da Lua, Deraldo da Galeria 13, o dono do Bar Raso da Catarina entre tantos mais, uma fauna que exalava humanismo e solidariedade por todos os poros. Em homenagem ao caro amigo, transcrevo fragmentos do já escrito e um pedido de desculpas pela falta de conclusão. Quem sabe agora vai... 

“Fomos colegas no Ginásio de Piritiba de 61 a 64, em sua primeira turma de licenciandos, tendo sido o orador oficial daquele grupo. Aluno participante, já demonstrava desde então grande sensibilidade literária e facilidade de expressão, prenunciando o poeta que mais tarde se tornaria.

Não tinha um padrão de comportamento exemplar para os parâmetros colegiais, estabelecidos pelos caros mestres professores Osvaldo e Ana Macedo, nem tão pouco figurava na galeria dos alunos mais aplicados da nossa turma. Porem, compensava esta aparente insubordinação, com uma ativa disposição para o debate, para a contestação, para o escracho.  Com estes ingredientes explosivos, aliada uma inata fluência verbal, estava definida uma personalidade polêmica, que já sinalizava clara aptidão para as lides jurídicas, em que ele viria a transitar por um certo período da sua vida.

Em um trabalho de Historia do Brasil, conduzido pela Prof.ª Leonor Macedo, foi realizado um júri popular em que a figura de Tiradentes era posta no banco dos réus, quanto ao seu possível gesto de patriotismo ou traição.
Representamos o personagem de Tiradentes, devidamente caracterizado: barba, bata comprida, cordão de São Francisco, crucifixo, olhar de mártir tal qual as gravuras de nossos livros. Entramos mudo e saímos calado como pedia o papel, mas fartamente elogiado por Leonor, pela expressividade teatral demonstrada. Carlos funcionou como advogado de defesa e Noquinha como promotor. Foi distribuído entre as equipes, um roteiro de como se processaria o júri, e também as fontes de pesquisas para consultas, tendo cada uma das partes liberdade em aprofundar o acontecimento histórico de acordo a sua visão e conhecimento da Inconfidência Mineira. O embate jurídico ocupou toda manhã daquele sábado, dia especialmente escolhido para apresentação do trabalho, que contou com uma platéia atenta e vibrante, formada por alunos e pessoas interessadas na encenação.

As intervenções de Carlos eram arrebatadoras. Partindo de um ponto de vista tratado com certa superficialidade pelos livros de nossa história oficial, Carlos desancava o colonialismo português e seus interesses comerciais. A galeria vibrava cada vez que o vozeirão de Carlos ecoava pela sala, acompanhada de gestos teatrais em defesa do herói nacional. Emocionado e aplaudido, Carlos declamava versos libertários do poeta e inconfidente Tomás Antônio Gonzaga. O promotor insistia na tese de traição ao jugo português, por parte de José Joaquim da Silva Xavier, o que reforçava ainda mais os argumentos de defesa. Como era de esperar, ao término da demanda forense, Tiradentes foi absolvido".

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