“Não temerás os terrores da noite, nem a seta que voe de dia, nem peste que anda na escuridão, nem mortandade que assole ao meio-dia. Mil poderão cair ao teu lado, e dez mil à tua direita; mas tu não serás atingido”. A citação de trecho do belo Salmo 91 talvez ficasse melhor nas palavras da “samaritana das frases alheias” ou de um desses “fariseus festeiros” que oram pela chuva de olho na caixa registradora, serve como ilustração da bela peça do mesmo nome em cartaz na Sala do Corro do Teatro Castro Alves.
A partir do livro de Dr. Dráuzio Varella, Estação Carandiru, relatos de seu acompanhamento médico por vários anos aos detentos daquele inferno penitenciário, o texto em cartaz, com bons atores baianos, reproduz a experiência de sobreviventes do massacre ocorrido há dez anos. Humanos como nós são seres que não despertam qualquer sentimento de piedade ou compaixão. São ou se transformaram em seres bestiais, maus, indignos, repulsivos, carregando homicídios inclassificáveis, penas que nem Matusalém cumpriria vivesse o tempo que vivesse. É a humanidade que rasteja, a brutalidade em seu estágio mais degradante, criminosos de alta periculosidade, homens maus, bichas sórdidas compõem o inferno que explodiria a qualquer momento, como naquela noite assombrosa em que o presídio foi invadido por forças policiais e 111 execuções foram contabilizadas. Mas foram mais, bem mais...
Os atores Fábio Vidal, Duda Woyda, Lúcio Tranchesi, Rafael Medrado dão ao texto uma autenticidade desconcertante, como uma espécie de soco no estômago, trágico e poético. Um teatro que faz pensar, refletir e que foge ao besteirol que povoa a maioria das salas da cidade.
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