A quartelada militar de 64, que no próximo mês completa 50 anos, mas sem nada a comemorar, a não ser como um estorvo que esperamos nunca mais ver repetido em nosso país, já rendeu bons e maus filmes, alguns sofríveis, mas muito ainda tem a ser explorado como filão, desta aventura macabra empreendida por maus brasileiros. Tanto pode ser por um viés poético e lírico como O ano em que meus pais saíram de férias, do Cao Hamburguer, como na brutalidade extrema de Batismo de sangue que narra as sessões de torturas que o Frei Tito de Alencar entre outros dominicanos foram vítimas da sanha cruel do delegado Sérgio Fleury e seus brutamontes, no filme do diretor Helvécio Ratton.
A diretora paulista Tata Amaral, com seu Hoje,
retrata por um ângulo inusitado, a reparação oficial concedida a uma militante de
esquerda pelo desaparecimento de seu companheiro, como um dos tantos que a
ditadura militar, e seus algozes, até hoje ainda não prestou conta onde se
encontram os corpos destes mortos sem sepultura. Vera (a militante Ana Maria),
papel premiado da atriz Denise Fraga,
com a grana recebida a tÍtulo de indenização pelo sumiço de seu marido,
representado pelo ator uruguaio, César
Trancoso, compra um apartamento.
Acontece que no dia da mudança, Vera recebe a inesperada visita do companheiro, dado como desaparecido e fato gerador da indenização e do próprio apartamento. A partir daí a protagonista e seu companheiro são levados a um verdadeiro acerto de contas de suas trajetórias na militância, em cenas que transbordam emoções, culpas, delação, acusações e tensão, muita tensão, em um único cenário que é o próprio interior do apartamento. No calor desta busca e relatos dos caminhos trilhados, o companheiro quer saber de Vera em qual momento ela tinha se certificado mesmo de sua não existência, ao que ela responde, “hoje”, para que de fato aquelas vidas enfim fossem dadas como definitivamente separadas, mortas para cada um de si.
Bom filme, como muitos que
ainda podem ser contextualizados dentro e fora do período da ditadura militar,
de triste memória para todos nós, mas fonte esclarecedora daquilo que nunca é
demais repetir e dizer “Brasil – Nunca mais”.
Fotos: Hoje
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