Dos meus tempos de pensionato nos Barris lembro ter vivido cercado de música por todos os lados. No casarão nº 93 morava Dr. Edmundo, pai de nossas amigas Cristina e Lucinha, sócio participativo da Sociedade de Ópera da Bahia, que tinha o hábito de exercitar seus "dós de peito", no mesmo horário noturno em que ocupávamos a sala da pensão, para com nossos apontamentos e rascunhos revisarmos os assuntos dados em aula, durante o dia. Dr. Edmundo era um armário com quase 200 quilos por dois metros de altura, dono de um agudo possante e potente com capacidade de invadir a cavidade mais profunda de nossos ouvidos e de lá não sair por pouca coisa.
Também desfrutávamos no 91, da vizinha companhia do professor e maestro Almiro Ferreira, que costumava solar na flauta ou no sax alguns dobrados e hinos, além de acompanhar as belas vozes das suas duas filhas participantes do canto coral. Aqui a barra era mais amena e, várias vezes fomos brindados com a beleza das “Bachianas Brasileiras”, por exemplo. Enquanto nós, cantávamos por tudo. Com saudade da família, dos amigos, da namorada; para conquistar as moças do pensionato de D. Jeté; para a bela Pilar, filha de Dr. Adriano, nosso vizinho da casa em frente; enfim, cantava-se porque as vezes não tinha nada mais interessante para fazer.
Desfilávamos nestas oportunidades todo o
repertório dos “Beatles” que já
conhecíamos, através das versões cometidas pelos conjuntos nativos, tentando
impressionar a bela Pilar, que
provavelmente àquelas horas dormia, indiferente. Novo dia ,e Pilar seguia impassível, pairando sobre
a nossa paixão impossível. Vez por outra e não poucas, Dr. Adriano chegava atacado, injuriado com o corre-corre de suas
lides jurídicas e nos recepcionava no meio da noite, com a presença da Rádio Patrulha, que ele convidava para
os nossos saraus de porta de rua. Atabalhoados e aflitos, corríamos para casa,
cuja porta estava sempre entreaberta por uma questão de precaução, largando na
calçada, as letras das músicas, cigarros e fósforo, ao primeiro sinal da sirene
que sempre escutávamos já nas imediações do Rockfeller. Mas, “um dia gatinha
manhosa, eu prendo você no meu coração, quero ver você..”
Fotos: Casarões dos Barris -
(No casarão branco, térreo, ficava o nosso pensionato)
(No casarão branco, térreo, ficava o nosso pensionato)
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