Para Lina
Esta foto me fez viajar por lugares que
a nossa memória parece esconder, mas que com um pouco de paciência e esforço se
revela clara, exata. A exceção dessa “moreninha” que imaginei ser Avonete, mas que segundo Moema é “Cafutí”, o que nada revelou, fui materializado naquela sala em uma
viagem dentro da casa que também foi tão minha, em “tantos momentos bons e
outros momentos maus”.
A janela e a porta na rudeza de sua
carpintaria se abriram para que eu, vindo do quintal, do quarto dos fundos,
chegasse até a sala vazia. Na mesa não havia o jogo de buraco, nem paciência,
já que o baralho havia sido emprestado a Profª.
Carminha para uma tarde recreativa com professores e alunos do Almirante Barroso. A cozinha ao lado
queimava, no fogão, as últimas brasas da lenha que preparou a 2ª refeição do
dia. O cimento vermelho do piso apresentava a textura luzidia de sempre, fruto
de uma devoção asséptica que era exemplar e exemplo. Esta pavimentação se
espalhava por todas as dependências da casa, quartos e salas, com o mesmo
brilho lustrado à base de cera “parquetina”, escovão e pano de chão.
As salas, que se estendiam uma após a
outra, eram separadas por arcadas. Cada uma das arcadas trazia como efeito
arquitetônico uma saliência abaixo da metade de sua curvatura, nas duas
laterais, formando uma pequena pilastra própria para a colocação de uma planta,
um jarro, uma peça decorativa. Ou bundas, quando se transformavam em assentos,
bancos. Ao lado da primeira sala, aquela em cuja mesa rolava o baralho havia o
quarto de Ed, Leco e dos amigos que perdiam o caminho de casa após noites, também
perdidas, em festas e farras. A sala do meio abrigava um conjunto de mesa, cadeiras
e uma peça, e que servia de salão de festas como aquelas em que promovíamos
“assustados” inesquecíveis. Sobre esta peça repousava imponente, em seu aspecto
de pura sedução, uma compoteira de doce de leite, inigualável. A cidade inteira
babava e fazia uma dissimulada romaria de olhares “pidões” dirigidos à
compoteira, na esperança de serem distinguidos com o convite para o deleite
daquele manjar dos deuses.
Compondo a geografia desta sala e
arrematando o seu espaço físico, estava o quarto de Lina e de vários ídolos da “jovem guarda”, encastelado em suas
paredes, do rodapé ao teto, feito uma parada de sucesso sem intervalo para
comercial, além daquele da “Cera Parquetina”, às 07 horas da manhã, de qualquer
dia, executado por “mãezinha” e seu fiel escudeiro, o escovão.
Por fim, a sala de vista, a porta
lateral da rua e a janela, observatório e confessionário dos que passavam e
paravam a espera de uma notícia, uma novidade. ou uma taça de doce de leite. “Mãezinha” era depositária de segredos
e um túmulo na guarda destas confissões até que algumas nuvens negras se
avizinhassem. Quanto ao doce de leite, bem poucos eram agraciados com o convite
para sorver uma taça de uma iguaria sem igual.
Foto: Dona Zilda e filhos
Grande Bazo, entrelacei sua viagem à minha, me vi em cada momento na sua brilhante e minuciosa descrição do lar da querida tia Zilda. Desculpe a intromissão e me permita acrescentar o quintal que abrigava goiabeira, folhas para chá, dois pequenos cômodos, o banheiro à esquerda logo após a última sala e principalmente a passagem de acesso para os fundos da casa de Vó Pequena, irmã de minha Vó Mosquita.
ResponderExcluirCaro amigo, como sempre sua presença benfazeja nestes momentos de saudades de pessoas tão queridas. Não há intromissão alguma em seus acréscimos, apenas mais luz em lugares iluminados.
ResponderExcluirAbs.