Minha
última experiência com a festa de Iansã foi um temporal, uma saraivada de raios no ar, não tive as graças, nem
a proteção de Santa Bárbara, mesmo tendo passado na igreja,
vestido camisa vermelha e recebido passe de uma mãe de santo. Transitava sem
sobressalto pelas proximidades do Mercado de São Miguel, quando
avistei ao longe a procissão se dirigindo em direção ao Mercado. A Baixa dos Sapateiros já
apresentava uma movimentação inquietante e frenética que qualquer detector de
vagabundo sinalizaria a área como conflagrada de maloqueiros.
Procurei
abrigo em uma loja, mas fui gentilmente dispensado pelo seu funcionário sob a
alegação de que cerraria as portas, temendo o tumulto, decisão, aliás, que
também tomaria se fosse comerciante daquela área próxima ao Mercado. Tentei me afastar o quanto pude do
local onde estava, tirei a carteira do bolso e pus na pasta, com documentos,
que carregava e a comprimi sobre o peito, já estando na calçada. Separei R$20,00 e coloquei no bolso do lado direito da calça, o mais profundo possível
em uma calça apertada, face alguns quilos que vinha ganhando nos últimos
tempos, por falta de uma dieta que tempos depois seria obrigado a fazer.
A multidão
crescia, os vagabundos fervilhavam e eu cada vez mais pressionado sobre a
parede em meio a pedidos de desculpas que faziam parte do achaque, com tons de
civilidade. Entre todos e tantos empurra-empurras consegui, com muito esforço,
me desvencilhar daquela turba, misto de fieis e maloqueiros, e respirar ares de
liberdade e de desejo de uma gelada. Ao tentar puxar os R$20,00 do bolso frontal da calça fui surpreendido com a sua ausência e a
constatação que tinha sido roubado por aqueles religiosos 171.
Ainda hoje
imagino a habilidade daquelas mãos, já que em nenhum momento senti estar sendo
bolinado e, se além da grana tivessem também levado o saco, só notaria quando
fosse ao sanitário no Bar de Dona Val, na Barroquinha. Eparrei Iansã!
Foto: Ilustrativa
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